segunda-feira, 25 de julho de 2016

POR UM CORPO DE MULHER





Por um corpo nu de mulher
fui concebido, nasci, estou vivo.
Por um corpo de mulher
bebi o leite que sustentou
meus primeiros pobres, sofridos
mas também deliciosos tempos de vida.
Por um corpo de mulher... minha mãe.

Por um corpo nu de mulher
meu corpo raquítico e serelepe
compartilhou cobertores puídos
brusinhas de flanela rotas,
alpargatas furadas, que faziam o riso
dos coleguinhas do grupo escolar
Por um corpo de mulher... minha maninha.

Por um corpo nu de mulher
minhas primeiras viagens alucinantes
em vendavais de delírios solitários
pelos mares de Onam.
Por um corpo de mulher... minha prima.

Por um corpo nu de mulher
os abraços carinhosos, os toques sensuais,
os beijos calidoces, as faces suadas, sedosas
das amigas, irmãs, companheiras Oguntés
do Movimento Negro, Feminista, Ecologista,
Lesbianistas,
Por um corpo de mulher... Minhas manas guerreiras.
Por um corpo nu de mulher
que me entesa, que beijo, sorvo...
que me recebeu dentro de si
e acolhe o sêmem do meu ser homem


 Por um corpo de mulher
que sinto o cheiro do cio
que após o estremecer do orgasmo
se cola viscoso quente gostoso
de suor, húmus, insuflando mais tesão
meu corpo de homem... não macho.
Por um corpo de mulher... minha amada
Por um corpo nu de mulher
que espera de mim amor, ternura, afago
abraços, cafunés de amante, amigo,
companheiro solidário, nunca dono-senhor
por um corpo de mulher... meu corpo
por um corpo de mulher
que se não existisse, sequer
meu próprio corpo existiria,
jamais seria concebido.

Por um corpo de mulher...
meu corpo existe e vive.
Por um corpo nu de mulher
por todos os corpos de mulheres
todos esses corpos sublimes
fêmeos, femininos que juntos
fazem fêmea e feminina a natureza.
Por todos os corpos nus de todas as mulheres
que compartilham com o meu todos
os espaços visíveis, e não visíveis
mas tão palpáveis e reais no Orun
e no Aiyê, não posso ser cúmplice
e criminoso de todas as ameaças
e agressões à integridade de
seus corpos de mulheres.


Por um corpo nu de mulher
não posso ficar covardemente omisso
às violações físicas e mentais
cotidianas à mulher como se
não fossem violações também a mim.


 Por um corpo nu de mulher
preciso cotidianamente arriscar
a integridade de meu corpo de homem
pois tudo que viola corporalmente
a mulher agride a vida, e tudo que
agride a vida agride a natureza
e tudo que agride a natureza agride
a mim que também sou um corpo/ser dela.


                     Deley de Acary



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